“A política de promoção do turismo do Norte de Portugal continua a ser um pouco dispersa e inconsistente”

- Considera o Professor Emídio Gomes

“O crescimento do turismo no Porto e Norte de Portugal é um facto consistente nos últimos 10 anos. Estávamos no caminho certo quando, nessa altura, fizemos uma forte aposta na promoção do nosso aeroporto, peça fulcral neste desenvolvimento”, considera Emídio Gomes, em entrevista que concedeu à NL do ISLA.

Nesta entrevista, Emídio Gomes, professor catedrático da Universidade do Porto, e ex-presidente da CCDRN, considera ainda que a economia do Norte tem tido “um desempenho absolutamente exemplar. Tendo sido a primeira das regiões a sentir os efeitos da crise, logo em 2008/2009, também foi a primeira a dar um contributo nacional para a saída da mesma.”

O também ex-administrador executivo da Junta Metropolitana do Porto recorda que “a partir de 2010 a região do Norte de Portugal tem aumentado em cerca de mil milhões de euros por ano e saldo positivo da balança de transação de bens, que se situa hoje em valores próximos dos sete mil milhões de euros, de longe o maior do país.”

Para um mais completo conhecimento do pensamento académico, político e económico de uma das figuras mais relevantes do Norte, aqui deixamos, na íntegra, a entrevista que nos foi concedida pelo professor doutor Emídio Gomes.

 

P -  O Professor Emídio Gomes é um académico e investigador, profundo conhecedor da formação que é dada em Portugal. Da sua experiência nacional e internacional, nomeadamente enquanto ex-pró-reitor da Universidade do Porto, e investigador no Canadá, que avaliação faz do nosso ensino superior, quando comparado com o que é feito noutros países dentro e fora da Europa?

R – A qualidade média do ensino superior é elevada em Portugal, podendo comparar com o que se faz na esmagadora maioria dos países desenvolvidos. Podemos aliás afirmar que existe até alguma falta de sintonia entre a qualidade da formação de recursos humanos e o aumento do emprego qualificado. 

 

P – Considera que o processo de Bolonha, após estes anos de aplicação entre nós, atingiu os objetivos que os governos pretendiam? Que resultados já é possível identificar em Portugal, ao nível da formação superior dos nossos jovens estudantes?

R –  É muito difícil ter uma opinião definitiva, porque há uma grande variação nos resultados obtidos entre as diferentes instituições. Infelizmente o que se assistiu em muitos casos foi a uma simples compressão temporal dos programas de ensino, sem a necessária adequação ao novo modelo. Creio, no entanto, que lentamente o modelo irá caminhar para uma consolidação mais forte entre os vários graus de ensino e a sua interação e ajustamento às necessidades do mercado. 

 

P – Conhece bem o ensino superior público e privado português. Como avalia, genericamente, as diferenças de formação que são dadas aos estudantes nas instituições públicas e privadas?

R – Infelizmente o ensino superior privado não tem tido condições para uma afirmação mais sólida no nosso país. Está sobretudo centrado nas grandes áreas urbanas, sofrendo as iniciativas fora deste contexto de fortes dificuldades em se afirmar. No setor público a qualidade das universidades é em geral elevada, o mesmo não acontecendo nos institutos politécnicos, que apresentam grandes diferenças entre si. 

 

P – O governo anterior lançou no nosso sistema de ensino os chamados cursos superiores não graduados, vulgo TESPs, como forma de facilitar aos jovens uma mais rápida entrada no mercado de trabalho, sem prejuízo de poderem prosseguir estudos para níveis graduados. Que avaliação faz desta iniciativa, e, do que lhe é dado conhecer, que resultados espera destas novas formações?

R –  A iniciativa é seguramente muito meritória e pode dar excelentes resultados no futuro, sobretudo se não for distorcida por algumas instituições, que, tal como acontecia nos CET, querem agora fazer destes novos cursos mais uma forma de entrada pura e simples nas licenciaturas e mestrados. Ou são impostos limites ou uma vez mais vamos desaproveitar uma oportunidade.

“O ensino profissional tem que ser cada vez mais valorizado, uma vez que permanece ainda muito estigmatizado”

P – A oferta de cursos de formação profissional ao nível do ensino secundário tem vindo a aumentar significativamente no nosso país. De resto, muitos estudantes que entram nos TESPs são provenientes desses cursos secundários. Como avalia o que tem sido feito neste segmento, e o que pensa deste tipo de formação, face ao nosso tecido económico e empresarial?

R – O ensino profissional tem que ser cada vez mais valorizado, uma vez que permanece ainda muito estigmatizado como sendo em grande parte a alternativa possível para os piores alunos. É preciso um esforço conjunto de todo o sistema na sua valorização, devendo mesmo ser solicitado um esforço às instituições de ensino superior neste desafio, através de protocolos de colaboração com o ensino secundário. 

 

P – Para além de académico exerceu cargos relevantes na estruturas político-administrativas do Estado, nomeadamente na então Junta Metropolitana do Porto e como Presidente da CCDRN. Destas suas longas experiências como avalia a descentralização de poderes que o atual Governo tem vindo a querer implementar?

R – É um tema recorrente e, infelizmente, habitualmente mal tratado e ao sabor das sucessivas conjunturas políticas. Ter um Presidente de CCDR vulnerável às interferências do poder político em áreas da sua competência exclusiva é grave; mas também creio que fazer depender a sua nomeação de um sindicato de votos limitado só irá agravar o problema. A questão fulcral é, e será, a transparência, o grau de isenção e a autonomia destes cargos de matriz local e regional. 

 

P -  Foi uma das principais personalidades políticas que mais se empenhou na implementação do “Portugal 2020”, nomeadamente enquanto Presidente da CCDRN. Que balanço faz do que foi feito neste segmento na vigência do anterior Governo, e do que está a ser executado pelo atual? 

R – O Portugal 2020 tem um objetivo muito claro, centrado na competitividade da economia, através da promoção dos valores da ciência, inovação, aumento da capacidade competitiva das PME e qualificação dos recursos humanos. Estes eixos representam cerca de dois terços do total dos diferentes programas, sendo o NORTE 2020 um bom exemplo disso mesmo. Os primeiros resultados são animadores e mostram que embora o caminho seja longo valerá a pena ser percorrido. Se o atual governo vier a fazer uma reprogramação em sentido contrário, então os resultados deste esforço estarão novamente em causa.

“A Região Norte foi a primeira a dar um contributo nacional para a saída da crise.”

P – Como homem do Norte como vê o desempenho do tecido económico desta região, nomeadamente durante o período maisprofundo da crise económica, e no atual estado de lenta recuperação?

R – É um desempenho absolutamente exemplar. Tendo sido a primeira das regiões a sentir os efeitos da crise, logo em 2008/2009, também foi a primeira a dar um contributo nacional para a saída da mesma. A partir de 2010 a região do Norte de Portugal tem aumentado em cerca de mil milhões de euros por ano e saldo positivo da balança de transação de bens, que se situa hoje em valores próximos dos sete mil milhões de euros, de longe o maior do país. Ou seja, a região com o PIB per capita mais baixo é a que mais contribui para o equilíbrio das contas. 

 

P – Muito se fala do crescimento do Turismo no Porto e Norte de Portugal. Que avaliação faz às políticas públicas, centrais e locais que têm sido desenvolvidas nos últimos 10 anos? Podemos acreditar que o crescimento turístico é sustentável para a economia das cidades mais atrativas, e para a Região Norte em geral?

R – O crescimento do turismo no Porto e Norte de Portugal é um facto consistente nos últimos 10 anos. Estávamos no caminho certo quando nessa altura fizemos uma forte aposta na promoção no nosso aeroporto, peça fulcral neste desenvolvimento. Alguns fatores do contexto internacional também vieram ajudar e têm sido aproveitados. Os grandes eventos internacionais têm sido praticamente o único fio condutor consistente na política de promoção, que continua um pouco dispersa e inconsistente. 

P – Está disponível, pessoal e profissionalmente, para um dia regressar a funções meramente políticas, ou técnico-políticas, ou definitivamente regressou à academia para ficar?

R – Nos últimos 14 anos tenho estado disponível para servir a minha região e o meu país, sempre que tenho condições pessoais para um desempenho positivo nas funções para que tenho sido convidado. Na CCDRN foi diferente. Participei num concurso público em conjunto com outros 89 candidatos, tendo ficado destacado na primeira fase de seleção da CRESAP. Da short list das três pessoas  indicadas por esta entidade o governo entendeu que a minha escolha era a mais adequada, o que  muito me sensibilizou. Desempenhei o cargo sempre com isenção e independência relativamente a pessoas, entidades e territórios da região. Foi público que o atual governo fez uma negociação paralela com alguns municípios relativamente a umas verbas específicas, pretendendo posteriormente a sua validação através de uma interferência gravíssima na autonomia da autoridade de gestão do programa NORTE 2020. Obviamente que me recusei a colaborar num simulacro de concurso, como não poderia deixar de ser. As consequências foram irrelevantes para mim porque proceder de outra forma não faz parte da minha forma de estar na vida.

P – Em período de pré-atmosfera para eleições autárquicas, quer deixar uma mensagem aos autarcas ou candidatos a autarcas do Norte de Portugal, cujos territórios e populações conhece como muito pouca gente?

R –  Tenho na quase totalidade dos autarcas gente que muito estimo, sabendo que o contrário também é verdade. Cada território da região é um local sagrado enquanto tal. Que continuem a lutar pelo seu desenvolvimento económico e social, com seriedade e muito ânimo.

Entrevista de Manuel Pinto Teixeira
Foto de Arquivo

Emídio Gomes: Professor, Político e Gestor?

Emidio

Emídio Ferreira dos Santos Gomes é natural de Massarelos, Porto, onde nasceu em 1959.

Licenciado em Engenharia Zootécnica pela Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (1984), é Mestre (1987) e Doutorado em Ciências Biomédicas pela Universidade do Porto (1991).

É Professor Catedrático, de nomeação definitiva, do Instituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar da Universidade do Porto (ICBAS).

Dos cargos sócio-profissionais desempenhados, destacam-se:

  • Presidente da CCDRN - Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte, 2013 a 2016;
  • Diretor da Escola Superior de Biotecnologia da Universidade Católica Portuguesa 2011 a 2013;
  • Presidente da Portus Park, Rede de parques de Ciência e Tecnologia & Incubadoras;
  • Membro do Conselho Nacional para o empreendedorismo e Inovação;
  • Pró-Reitor da Universidade do Porto para a Inovação e Relações Empresariais, 2009-2011;
  • Presidente do Conselho Geral da Universidade de Trás-os-Montes, 2009;
  • Administrador Executivo da Junta Metropolitana do Porto, 2005-2009; 
  • Presidente do Conselho de Administração da Agência de Inovação, 2002-2005;
  • Membro do Conselho Consultivo da COTEC, 2003-2006;
  • Membro do Conselho Estratégico da Universidade do Minho, 2003-2009;
  • Vice-Presidente da Fundação para a Ciência e a Tecnologia, 2002;
  • Presidente do Instituto de Ciências Agrárias da Universidade do Porto, 1996-1999;
  • Assessor da Administração do Grupo SOJA DE PORTUGAL, 1990-2002;
  • Conselho Diretivo do Instituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar da Universidade do Porto, 1988-1990;
  • Coordenador do Colégio de Engenharia Agronómica da Ordem dos Engenheiros (Região Norte), 1998-2004;
  • Gestor no sector agro-alimentar e biotecnologia, 1991-2008.

Com um percurso científico que regista mais de 60 trabalhos em revistas internacionais, incluídas no Scientific Citation Index, assinala-se, ainda, a orientação de 12 teses de Doutoramento e participação em 22 projetos de investigação, oito dos quais financiados pela União Europeia.

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